Decisões beneficiam empresas com prestações de parcelamentos em atraso
Por Joice Bacelo — Do Rio
A Justiça Federal de Minas Gerais vem permitindo que empresas obtenham a certidão de regularidade fiscal mesmo com prestações de parcelamentos em atraso. Esse entendimento – proferido em pelo menos três decisões recentes – vale somente para contribuintes que, apesar de inadimplentes, não foram excluídos dos programas.
É comum nos parcelamentos de dívidas tributárias haver uma regra específica com os motivos que podem levar à exclusão do contribuinte. Todos eles preveem, por exemplo, um determinado número de parcelas em atraso.
O Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), o último do tipo Refis lançado pelo governo federal, no ano de 2017, por exemplo, determina a exclusão com três parcelas consecutivas em aberto ou seis alternadas.
Já o parcelamento do tipo simplificado, que é oferecido o ano todo pelo governo e permite o pagamento das dívidas em até 60 meses, prevê a exclusão do contribuinte com três parcelas em atraso somente.
Os casos que foram julgados em Minas Gerais envolvem empresas com duas prestações em atraso. Elas estão inadimplentes, mas permanecem com o parcelamento vigente.
As três são prestadoras de serviços e vêm sendo fortemente atingidas pela crise gerada pela pandemia, segundo o advogado Túlio Pieroni, do escritório Massara Pieroni, que atua nesses casos. Antes, afirma, as companhias nunca atrasaram os pagamentos.
“Mas esse nem foi o motivo determinante para a decisão. Nós argumentamos que o artigo 151, inciso 6º, do CTN [Código Tributário Nacional] prevê que o parcelamento é causa de suspensão de exigibilidade do débito tributário. As empresas, apesar do atraso nas parcelas, mantinham os parcelamentos vigentes”, diz.
A Receita Federal havia negado o pedido de renovação das certidões com o argumento de que todos os pagamentos deveriam estar em dia.
Uma das decisões que beneficia o contribuinte foi proferida pela 5ª Vara Cível Federal. Envolve uma empresa do setor de limpeza. A companhia tem duas prestações em atraso no Pert, referentes aos meses de setembro e outubro, e outros valores em aberto, do mês de outubro, no parcelamento simplificado.
“As pendências apontadas como impeditivas da emissão da certidão de regularidade fiscal não se prestam a justificar a negativa de fornecimento do referido documento”, diz, na decisão, o juiz Itelmar Raydan Evangelista, levando em conta as regras de exclusão dos parcelamentos (processo nº 1055147-74.2020.4.01.3800).
As outras duas decisões, nesse mesmo sentido, foram proferidas pela 7ª e 22ª Vara Cíveis Federais de Minas Gerais (processos nº 1055139-97.2020.4.01.3800 e nº 1055168-50.2020.4.01.3800, respectivamente). As três têm caráter liminar.
Os contribuintes, nesses casos, obtiveram o direito à chamada certidão positiva com efeito de negativa. Indica que o contribuinte tem débitos – e por isso é positiva -, mas tem efeito de negativa porque estão garantidos ou há causa de suspensão da exigibilidade (uma decisão judicial ou o parcelamento, por exemplo).
O resultado prático, no entanto, é o mesmo da Certidão Negativa de Débitos (CND). Sem esse documento, as empresas não conseguem participar de licitações, de concorrências ou mesmo obter empréstimos.
Não há muitas decisões desse tipo no país, de acordo com advogados. A última que se tem notícias, com decisão favorável ao contribuinte, é do ano de 2012. Foi proferida pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1º Região, com sede em Brasília.
O advogado Marcelo Annunziata, do escritório Demarest, diz que as discussões mais comuns na Justiça envolvem a exclusão dos parcelamentos. E, ainda assim, mesmo nesses casos, os contribuintes geralmente obtêm decisões favoráveis quando conseguem demonstrar que agiram de boa-fé.
Em um julgamento recente, realizado na 2ª Turma do TRF da 3ª Região, que abrange os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, um contribuinte conseguiu se manter no programa. O Fisco tentava excluí-lo porque algumas parcelas que foram pagas entre a adesão ao parcelamento e o momento de consolidação tinham valores um pouco mais baixos e o contribuinte não acertou as diferenças.
“A boa-fé do contribuinte é evidente. Até a propositura da demanda vinha mantendo em dia o recolhimento das prestações mensais, bem como demonstrou interesse na regularização do parcelamento junto à administração fazendária”, afirma a decisão (processo nº 5000275-31.2017.4.03.6115).
Quando a exclusão do programa sequer é cogitada, diz Annunziata, não há motivo nenhum para o Fisco negar a certidão de regularidade fiscal. “Uma questão decorre da outra. Se não foi excluído, não está inadimplente. Os efeitos do programa continuam válidos e a exigibilidade da cobrança daqueles débitos continua suspensa.”
Leo Lopes, sócio do FAS Advogados, lembra que no artigo 151 do Código Tributário Nacional consta somente “parcelamento” como causa para suspensão da exigibilidade do débito. “Não fala em parcelamento em dia ou parcelamento sem nenhum débito”, afirma.
O advogado chama a atenção ainda que, na esfera federal, as certidões de regularidade fiscal precisam ser renovadas a cada seis meses. Significa, então, que se o contribuinte continuar atrasando os pagamentos, ele será excluído do programa e da próxima vez não terá acesso ao documento.
“O fato de reconhecer o direito à certidão de regularidade fiscal tendo uma ou duas parcelas em atraso não significa que os juízes estão valorizando ou protegendo a inadimplência”, diz Leo Lopes.
Para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), no entanto, os fundamentos legais para a exclusão de parcelamento e a expedição de certidão não se confundem.
Diz, em nota, que “os parcelamentos têm por objeto débitos vencidos e não pagos no órgão de origem” e que “o parcelamento, embora provoque a suspensão do crédito, não implica a suspensão de exigibilidade das parcelas”.
Consta ainda na nota que, em razão da pandemia, tanto a PGFN como a Receita Federal prorrogaram o prazo de validade das certidões de regularidade fiscal.
Fonte: Valor
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