STF vai recomeçar julgamento sobre IR na pensão alimentícia

 Maioria dos ministros da Corte já havia votado contra a incidência do imposto

 Por Beatriz Olivon e Adriana Aguiar — De Brasília e São Paulo

Após a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votarem contra a incidência de imposto de renda (IR) sobre valores recebidos como pensão alimentícia, no Plenário Virtual, a Corte terá que recomeçar a análise do zero. Apesar dos votos de seis dos onze ministros favoráveis a quem recebe o benefício, o julgamento foi suspenso por um pedido de destaque. Será reiniciado no plenário presencial, porém, não há previsão de quando o caso voltará à pauta.

Em geral, esses valores são recebidos por mães separadas com filhos e incide alíquota de até 27,5% de IR. Para os cofres daUnião, a tese pode gerar perda de arrecadação de R$ 1 bilhão anual, segundo dados da Advocacia-Geral da União (AGU), caso a maioria dos ministros conclua pela inconstitucionalidade da incidência (Adin 5422). O valor pode chegar a R$ 6,5 bilhões levando em conta também os cinco anos anteriores.

O tema é julgado em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) em2015. A ação questiona dispositivos da Lei n° 7.713, de 1981, e do Regulamento do Imposto de Renda. Os artigos preveem que as pensões alimentícias são tributadas pelo Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), em nome de quem as recebe.

Segundo o advogado autor da tese, Rolf Madaleno, diretor do IBDFAM, a cobrança é inconstitucional porque o devedor da pensão já teve esse rendimento tributado ao receber seus vencimentos. “Cobrar o IR de quem recebe a pensão é tributar mais uma vez a renda que já foi tributada. Há uma injustiça, uma bitributação”, diz.

A situação ainda gera um desequilíbrio, na opinião de Madaleno. Na separação, em média 30% do rendimento do pai deve ser pago como pensão, segundo o advogado. E sobre esses 30% ainda incidirá até 27,5% de IR, que dessa vez será pago pela mãe que recebe. O pai, por outro lado, que fica com 70% do seu salário, ainda poderá deduzir os valores pagos na declaração doIR.

A AGU, por sua vez, alega que a Constituição não pormenoriza o sentido de renda ou proventos de qualquer natureza – base de cálculo do imposto de renda. Também diz não haver bitributação. Isso porque os valores de IR descontados no vencimento são do devedor do imposto, que pode deduzir esses valores ao fazer a declaração anual à Receita Federal. Já o imposto sobre a pensão é pago por quem recebe.

A arquiteta Camila Klein aguarda ansiosamente a decisão do STF. Ela se separou em 2015 e, de forma consensual, combinou o valor de R$ 20 mil de pensão para sua filha, com dois anos na época. Depois, pediu a revisão da pensão na Justiça, o que ainda está pendente. “Ela cresceu e isso não cobre os seus gastos. Se compra bem menos coisas para uma criança de dois anos doque para uma de sete”, diz.

Hoje, dos R$ 20 mil, ela fica com cerca de R$ 14,5 mil de pensão, ao descontar o IR. Mas só de escola, são quase R$ 8 mil em custos. A filha ainda faz cursos extracurriculares de reforço, música, jazz, ginástica olímpica, e deve começar na natação. “Cada curso custa cerca de R$ 1 mil”, diz. Além dos gastos com roupa, material escolar, médicos, babá, folguista, presentes para aniversários. Para ela, ter que recolher quase 30% do valor recebido de pensão não faz sentido e faria muita diferença. “Eu brinco que tenho sociedade com o governo”, diz.

Como no caso de Camila, na maioria das vezes, após uma separação, os filhos ficam com a mãe, uma das teses destacadas noSTF é a de que essa tributação alimenta a desigualdade de gênero. O tema começou a ser julgado na Corte no dia 22 de março. Na ocasião, o relator, ministro Dias Toffoli, decidiu afastar a incidência do IR sobre os alimentos ou pensões alimentícias quando fundados no direito de família (Adin 5422). Declarou a cobrança inconstitucional.

Ao acompanhar o relator, o ministro Luís Roberto Barroso falou explicitamente da desigualdade de gênero. Segundo ele, quem paga a pensão – via de regra, o pai – poderá abater da base de cálculo do Imposto de Renda a integralidade desses valores. Mas a mulher, responsável civil e tributária pela criança ou adolescente, deverá declarar aquela quantia como rendimento recebido, que se somará a outros rendimentos para fins de incidência do IR.

Enquanto os valores pagos como pensão são tributados, se eles forem destinados diretamente ao filho – ao pagar escola, plano de saúde, entre outros – não há o IR. No caso de uma pensão de R$ 2 mil, por exemplo, em que o cuidador tem salário de R$ 3 mil, para fins de IRPF, se chegará ao valor de R$ 505,64 de imposto. Mas, se o pagamento é de R$ 1,8 mil diretamente ao plano de saúde, ao colégio e ao transporte – e os R$ 200,00 restantes são transferidos para a conta de despesas com o filho- para fins de IR, a renda mensal do cuidador é de R$ 3,2 mil e o imposto a pagar será de R$ 125,20. Os cálculos constam no voto do ministro Barroso.

O ministro Alexandre de Moraes pediu vista na época e, na sexta-feira da semana passada, também seguiu o entendimento do relator. Para ele, não faz sentido deduzir o valor equivalente da base de cálculo do IRPF do devedor, que possui capacidade contributiva comprovada, para submeter o alimentando, a parte mais frágil da relação familiar, à incidência desse imposto em seu desfavor.

As ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, assim como o ministro Ricardo Lewandowski, votaram no mesmo sentido. Mas, na sequência, o ministro Gilmar Mendes destacou o caso para o Plenário presencial.

Agora, os ministros que já votaram podem alterar o posicionamento até a conclusão do caso. Contudo, de acordo comDaniella Zagari, sócia do escritório Machado Meyer, não há motivo para modificação dos votos por não haver fato novo. Ela alerta, no entanto, que é relevante julgarem logo o tema porque a prática alimenta a discriminação de gênero na tributação.

Do aspecto tributário, Daniella sustenta haver atualmente bitributação. Para ela, se o casal está casado e tem filhos, parte da renda do casal custeia os filhos. Caso se separem, esse valor não se torna receita. “Não há acréscimo patrimonial”, afirma.

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